domingo, 30 de agosto de 2009

MEU IAIÁ, MEU IOIÔ

Sexo é padecimento. Sofre-se ereção, ereções. Ereção é uma doença consumptiva. Sófocles aos oitenta agradece aos deuses a libertação enfim do encargo. Sexo é a carne liberta da razão, febre delirante, paixão, esta gloriosa doença. Cláudia nas areias do Leme, Liliane numa escada em Botafogo, Joana num táxi a caminho do cinema, Tereza no terraço, Solange na Praça General Osório enquanto a noite e a calcinha caiam ao som bêbado da banda de Ipanema. O moreno de Estela, as sardas de Adalgisa. Adolescência é seiva, festa à qual Tânatos não é convidado, mas repara: Tânatos é ótimo penetra, Romeu na festa de Julieta. A boutade de Benjamin Jowett menos que conselho a adolescentes devesse ser lema e leme. Never apologise, never explain. Nada de desculpa, nem de explicação. Sabor, cheiro, contato, corpo é matéria objetiva, linhas, formas, volume, voz, sons. Sexo é êxtase e estase, sair de si, perder a cabeça. O bardo da Avon diz pela boca de Frei Lourenço que young men’s love then lies not truly in their hearts, but in their eyes. Sexo é sempre jovem. Última trilha do instinto. As coxas e o entrecoxas, o lombo em brasa, os hirtos contornos. Sexo é hino, perfilar-se é preciso. Toda mulher é vedete, todo homem um anjo torto.

quarta-feira, 26 de agosto de 2009


Muita gente nasceu em 63. Nascer parece tão rápido. Leva-se uma porrada na bunda e ouve-se: next! O taxímetro começa a rodar. Jango vira presidente, depois é que viraria lenda do que não foi. Pamplona explica pro Salgueiro pro Salgueiro explicar Xica da Silva pra classe média. Uns caras chatos, cabelinho de indiozinho da tv tupi, ficam pedindo e repetindo por favor, por favor, como se num sinal de trânsito. Uns morreram em 63. O Kennedy, por exemplo. Ali, do ladinho da Jackie, mas a cabeça em outro lugar. O bom foi o canal 2. Mas melhor ainda foi Ieda Maria Vargas. Ficar repetindo Ieda Maria Vargas, Ieda Maria Vargas e esperar pela revelação. O mais importante, aprender geografia. Seguindo aqui vem a Urca, a casa da Joana; atravessando o túnel, logo logo o Leme e a casa da Cláudia; o túnel do outro lado vai dar na casa da Angélica, quase Ipanema. Teve Papa. Teve Fellini reinventando o cinema. No fim do ano o Flamengo foi campeão. Bem no finzinho, acho que teve prorrogação. O que vale sempre tem.

domingo, 23 de agosto de 2009

Proust, Marcel saltava pocinhas e exausto, talvez, deu (sempre! sempre!) para escrever – e o fez com a desenvoltura e a elegância de quem saltasse pocinhas olímpicas. Criou um questionário de moças para circular por entre os amigos (de todos os sexos: àquela época, acho que cinco), acreditando cobrir lacunas de conhecimento que a simples conversação não alcançava. Eis o questionário, e com ele respostas minhas; alguém aí pega carona?


a) o cúmulo da miséria? a miséria é o cúmulo
b) onde gostaria de viver? o essencial e´ que haja musica
c) ideal de felicidade? o conceito de felicidade, em geral, é medíocre; o mínimo que se pode fazer é escapar dele
d) defeitos que merecem indulgência? defeitos merecem indulgência
e) heróis de romance? algumas noites no boteco com a galera de Point Counter Point
f) personagem histórico? JC
g) herói da vida real? Machado, Gláuber
h) pintor? Cézanne
i) músico? Bach
j) qualidade que mais admira no homem? a virilidade
k) qualidade que mais admira na mulher? a feminilidade
l) ocupação predileta? sexo, vícios cultivados e o labor
m) o que gostaria de ser? vir a ser é que é o xis da questão
n) principal traço de caráter? ter um já está de bom tamanho
o) o que mais aprecia nos amigos? o fato de serem, de fato, meus amigos
p) principal defeito? todos os meus defeitos são principais e merecem cuidado
q) sonho de felicidade na terra? a paixão
r) maior desgraça? o medo
s) cor? azul
t) flor? uma rosa é uma rosa é uma rosa é uma rosa
u) pássaro? o vôo da águia, o mergulho da gaivota, o canto da sabiá
v) autores em prosa? os 5 últimos Machado
w) poeta? Castro Alves
x) o que mais detesta? o rancor
y) fato militar admirável? eu não ter servido às Forças Armadas
z) como gostaria de morrer? dentre as minhas pretensões não está a de querer ser Deus
z’) lema? repito com as francesas: joie de vivre!

quarta-feira, 19 de agosto de 2009

blá blá blá


A palavra feito linha em Cézanne, que súbito torna-se volume. Como o alquimista hamburguês, no meio dos dezessete, em busca de ouro, meio por acidente – mas sabedor de que quem desloca, recebe – encontrasse o fósforo, menos nobre sem dúvida, no entanto tão útil. E quem a usa como se trouxesse o número oito às costas e chamasse para si a responsabilidade de mudar o resultado do jogo, lançasse, marcasse, fizesse – unhas, tripas, coração – o gol. Palavra é osso, duro de roer, a ser devorado, degustado a um só tempo com requinte de gourmet e voracidade de canibal. Aquém do humano constituído, e muito além.

domingo, 16 de agosto de 2009

Ok, quando se fala em jazz, ainda que entre tapas e beijos ao teu redor o pessoal comece a batucar um pagodinho, o primeiro nome que surge é o de Louis Armstrong - embora não tenha havido temperamento mais criativo que o de Charlie Parker.
Sua música durou, se tanto, uma década. Sobreviveu aqui em casa, onde reina absoluta.Se falo em jazz, bum-bum-baticumbum-ziriguidum, fala-se logo em Louis Armstrong - e Dizzy Gillespie foi seu óbvio herdeiro, tanto em destreza instrumental quanto em espírito de animador. Charlie Parker e Dizzy Gillespie formaram a dupla ideal, os Leandro e Leonardo do Olimpo musical. Aqui ambos eternizam Hot House, a paráfrase que o pianista Tadd Dameron fez de What Is This Thing Called Love?, de Cole Porter.
Sejam benvindos, febrilmente, a casa.